Psicose é uma condição médica definida amplamente como a perda de contato com a realidade podendo ser grave a ponto de aumentar o risco de o indivíduo não conseguir suprir suas necessidades básicas de maneira independente. As principais manifestações clínicas são delírios, alucinações, pensamento desorganizado e agitação / agressividade.
As principais causas de psicose são transtornos psiquiátricos – como esquizofrenia, transtorno delirante, depressão maior com sintomas psicóticos, transtorno bipolar com sintomas psicóticos -, psicose induzida pelo uso de substâncias, delirium, entre outros. Portanto, a causa autoimune não é, nem de longe, uma das principais hipóteses na maioria dos casos desta condição.
Com o crescente conhecimento adquirido na última década sobre doenças neurológicas autoimunes – principalmente as encefalites autoimunes – há um crescente número de casos de psicose nos quais se identificaram anticorpos anti-neurais, sugerindo um “ataque” dos anticorpos produzidos pelo próprio organismo, contra o cérebro. E o grande diferencial dessa entidade é a potencial reversão dos sintomas com imunoterapia (medicações que modulam a imunidade). Assim, uma doença que provavelmente progrediria e causaria inúmeros danos e restrições ao paciente, pode ser completamente curada.
Infelizmente são casos raros. E como reconhece-los?
Nas encefalites autoimunes comumente observa-se sinais e sintomas neurológicos (como alterações de memória, sonolência, alterações motoras e de sensibilidade) além dos sintomas psicóticos. Porém é intrigante a presença de casos de psicose isolada, ou seja, sem outros sintomas neurológicos, de origem autoimune. Assim, a entidade torna-se um desafio médico, levando comumente ao atraso no diagnóstico ou mesmo a não realização deste. Os principais sinais de alarme para se considerar o diagnóstico são: infecção recente, rápida progressão dos sintomas (menos de 3 meses), pouca resposta a medicações antipsicóticas, sintomas neurológicos focais, dor de cabeça, crise convulsiva, sonolência excessiva, presença de outras doenças autoimunes.
O principal anticorpo neuronal relacionado a estes quadros é o anticorpo anti-recepetor de NMDA (N-Metil-D-Aspartato), que pode ser pesquisado no líquor e /ou no sangue. O fato de os exames para pesquisa destes anticorpos não serem completamente difundidos (principalmente no sistema público de saúde), torna o diagnóstico ainda mais difícil, já que outros exames, como ressonância magnética, podem por vezes não fornecer as pistas necessárias.
Devido à dificuldade diagnóstica pelo pouco conhecimento da condição e pouco acesso a métodos adequados, a prevalência das psicoses autoimunes ainda é subestimada, porém este número tende a crescer com a difusão do conhecimento, principalmente tratando-se de uma condição com grande prejuízo a indivíduos – na maioria das vezes jovens – com potencial de cura. Além disso, é importante levar em conta que há poucos anos este diagnóstico nem mesmo constava nos registros médicos, deixando milhares de pacientes sem diagnóstico e tratamento corretos.
Para quem se interessar pelo assunto, a escritora americana Susannah Cahalan publicou em 2012 um livro autobiográfico descrevendo sua angustiante experiência diante de um episódio de uma psicose autoimune. Infelizmente, o livro não está disponível em português, mas vale o esforço da leitura em inglês pela riqueza de detalhes com que descreve seus sintomas.
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