Uso de Canabinoides em neurologia

Como os Extratos do Cannabis são usados atualmente em neurologia

Apesar de ser um tema muito frequentemente discutido nos dias atuais, o uso de extratos do cannabis para tratar doenças humanas é milenar. Contudo, a capacidade de isolar os canabinoides (substâncias extraídas do cannabis) biologicamente ativos e identificar sua maneira de ação no organismo, é mais recente. Seu uso em neurologia tem chamado a atenção pelos múltiplos potenciais de ação no sistema nervoso central (SNC).

Poucas pessoas sabem, mas nós, seres humanos, produzimos nossos próprios canabinoides, chamados de endocanabinoides. Eles têm o potencial de agir como reguladores das sinapses, controlando aspectos psicológicos e neurológicos do nosso organismo.
Quando falamos de canabinoides, nos referimos aos fitocanabinoides, que são extraídos das plantas, ou aos canabinoides sinteticamente produzidos. Apesar de serem substâncias presentes no cannabis, o uso medicinal delas é diferente do uso do da macinha, que possui inúmeros outros canabinoides e substâncias potencialmente tóxicas e com efeitos psicoativos.

Até o momento, a maioria das pesquisas realizadas com esta classe de medicações tem sido voltada para epilepsia, dor e espasticidade. No Brasil, um medicamento chamado Nabiximol,  composto por dois canabinoides,) foi aprovado em 2017 para o tratamento de espasticidade em pacientes com esclerose múltipla. 

Na Europa, EUA e Canadá, um outro canabinoide chamado nabilone, foi aprovado para uso em pacientes com náuseas refratárias relacionadas à quimioterapia, e tem sido usado também para dor refratária.

Epilepsia

Em 2018, o FDA aprovou nos EUA o uso do Canabidiol para tratamento de crises convulsivas em pacientes com síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut (síndromes epilépticas que se manifestam desde infância). Apesar de estudos em andamento evidenciando potenciais benefícios em diferentes tipos de epilepsia, seu uso aprovado nos EUA ainda é restrito a estas doenças.

Contudo, os mecanismos pelos quais esses efeitos benéficos ocorrem ainda não são claros, assim como efeitos do seu uso terapêutico a longo prazo. Um dos desafios atuais para os médicos é lidar com a crença anedótica do público em geral sobre o uso de canabinoides e o consequente aumento da procura por este tipo de produto, ainda sem aprovação para a maioria das doenças.

Outas Doenças

Outro uso dos canabinoides em neurologia visa o tratamento de dor neuropática (tipo de dor decorrente de lesão no sistema nervoso).  Em uma revisão sistemática recente, concluiu-se que há pouca evidência de benefício do uso de canabinoides nestes pacientes, com mais efeitos colaterais em comparação ao placebo.

Também tem sido frequente a indagação de familiares de pacientes com demência sobre os potenciais benefícios do uso de canabinoides nesta condição. Com frequência há vídeos e notícias pouco esclarecedoras circulando pela internet, sugerindo um benefício quase milagroso para sintomas comportamentais, como agitação e agressividade. Apesar de alguns relatos de casos de melhora destes sintomas em pacientes com demência grave, até o momento nenhum grande estudo foi realizado com este objetivo. Mesmo alguns pequenos estudos não evidenciaram melhora significativa com uso do tetrahidrocanabinol em sintomas como agitação, distúrbios do sono, mobilidade e quedas.

Mesmo o uso para espaticidade em pacientes com esclerose múltipla (para o qual já é aprovado) é controverso. Os ensaios clínicos mostraram que há uma parcela dos pacientes que apresentam boa resposta. Porém a recomendação é que se use primeiramente as terapias tradicionais e reservar o uso de canabinoides para aqueles que não apresentaram melhora.

Os efeitos colaterais mais comuns dos canabinoides são náuseas, fraqueza, alterações de comportamento e humor, fadiga e tontura. Apesar do apelo de ser um tratamento “natural”, não é possível dizer que os canabinoides são mais seguros e mais bem tolerados do que os tratamentos já aprovados.

Referência: Friedman, Daniel, Jacqueline A. French, and Mauro Maccarrone. “Safety, efficacy, and mechanisms of action of cannabinoids in neurological disorders.” The Lancet Neurology(2019).

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